sábado, dezembro 19, 2009

Não esquecemos: 19 Dezembro 1961

Na Morte do Zé

Para quê cantar-te, Amigo, se o meu canto
não pode dar-te a vida, estremecida?
Para quê chorar-te, Amigo, se o meu pranto
é gota de uma dor tão sem medida?

Não choro nem canto. Apenas grito
como uma fera ferida em pleno peito.
Vingança, negro alento e pão maldito,
não são sustento nem leito.

Teu corpo ensanguentado jaz no solo,
a mágoa de perder-te é sem consolo.
E mais não posso, Irmão, que a voz se embarga.
É noite. O tempo é frio. A esperança amarga.


Carlos Aboim Inglez


Nota:
- José Dias Coelho, artista plástico e membro do PCP, foi assassinado pela PIDE no dia 19 de Dezembro de 1961. Carlos Aboim Inglez, seu camarada e amigo, casado com uma irmã do artista (Maria Adelaide), encontrava-se preso, em Peniche. Foi aí que soube da notícia e escreveu este poema, que veio a ser publicado no livro póstumo, Soma Pouca, edições Avante, 2003.
- Retrato da autoria de João Abel Manta, outro amigo íntimo de José Dias Coelho.

3 comentários:

Paula Raposo disse...

E que sabia eu aos 7 anos?!!
Ainda bem que a memória existe para sabermos dela...
Beijos.

com senso disse...

A história da morte trágica de José Dias Coelho é um marco que define bem o carácter criminoso do regime que nos desgovernou antes do 25 de Abril.
Obrigado por nos trazer esta memória e esta bela homenagem!

André Amador disse...

Júlia obrigado por recordares o Dias Coelho!
Já agora numas sessões de comemoração do 25 de Abril organizadas pelo SPGL em Peniche, António Dias Lourenço contou-nos que para proteger (não denunciar) a casa para onde se dirigia, o Dias Coelho acelerou o passo, sendo morto pelos esbirros de Salazar! A casa era do também falecido "Mário Castrim".