segunda-feira, abril 28, 2008

Vale a pena ver

Do João Callixto, um amigo do tempo em que ambos fizemos parte de uma lista para a direcção da Associação de Estudantes da Faculdade de Letras, a célebre Lista E, que nos anos noventa venceu por três vezes consecutivas as eleições para aquele orgão associativo (um dia escreverei sobre isso) recebi o link para um filme extraordinário que merece a maior reflexão e divulgação possíveis.
Sugiro que percam uns minutinhos e vejam o como e o porquê das coisas, como tudo acontece e, ainda, como nada se deve ao acaso.

http://video.google.com/videoplay?docid=-3412294239230716755&hl=en

Reflexões em torno de María Zambrano

30 Abril - 4ª feira - 18,30 horas

Casa Fernando Pessoa

R Coelho Rocha, 16


Zília Osório de Castro (presidente do grupo Faces de Eva - Estudos Sobre a Mulher ), António Cabrita, a quem cabe a apresentação, Isabel Lousada e Maria João Cabrita também responsáveis pela edição, são os nomes presentes na mesa que assinala, no próximo dia 30 de Abril, pelas 18h30, na Casa Fernando Pessoa, a publicação do mais recente número da revista Faces de Eva, dedicado à filósofa espanhola Maria Zambrano.
Reflexões em torno de María Zambrano reúne uma dezena de textos que, a montante, cresceram sobre a realização de um Encontro Ibérico, de título homónimo, realizado no Instituto Cervantes, a 22 de Novembro de 2007, e que com o apoio do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa vieram à luz. No seu todo incide sobre o universo de ideias zambraniano, cobrindo a pluralidade de sujeitos enfatizados pela filósofa – da estética à poética, passando pela fenomenologia; da mística à ética e à política – dando-nos conta de uma história que se encontra por fazer ou por contar.

domingo, abril 27, 2008

Dia (noite) de sorte


Sabem os que me conhecem o lugar primordial que os livros assumem na minha vida. Como ocupam praticamente todo o espaço da minha casa. Como as livrarias e os alfarrabistas são os locais que mais visito. Quão confortável me é a sua companhia. E como não saberia viver sem eles.
Este amor pelos livros vem-me de miúda. Ainda não sabia ler e já ficava fascinada por quaisquer letras impressas. Pode parecer genético ou fruto do ambiente em que me criei, mas a verdade é que nasci numa casa sem livros e no seio de uma família onde apenas os homens tiveram direito a instrução. Livros, apenas aqueles onde o meu avô assentava o deve e o haver dos pinhais negociados ou das horticolas vendidas.
Acontece que ontem, inesperadamente, tive um encontro feliz com uma livraria recheada de livros raros e de onde trouxe duas preciosidades.
Fui com uma amiga ouvir jazz a um espaço lúdico-cultural lindíssimo, a Fábrica Braço de Prata, onde no antigo regime funcionou uma fábrica de material de guerra. Não foi a primeira vez que frequentei este local, mas foi a primeira vez que me detive mais atentamente na livraria que ali funciona. E foi uma surpreza perceber que a mesma se chama Livraria de Fundos, SA, precisamente porque se compõe de inúmeros fundos de editoras e distribuidoras desaparecidas, alguns já não em muito bom estado, é verdade, mas onde se podem encontrar preciosidades para os amantes dos livros.
Encontrei então duas obras belíssimas: uma História de Angola, publicada inicialmente pelo MPLA, em Argel, em Julho de 1965 e reeditada pela Afrontamento em 1975, e um exemplar de MFA, Dinamização Cultural e Acção Cívica, editada pela Ulmeiro e com as assinaturas de todos (ou grande parte) dos intervenientes nas mesmas iniciativas cívicas, como a de Carlos Paredes, Moniz Pereira, José Viana ou a de Vespeira, o autor do símbolo do MFA.
Ontem foi o meu dia (noite) de sorte.

sábado, abril 26, 2008

Eu também estive lá

I Encontro da Cançao Portuguesa, 29 Março 1974
Quem ontem assistiu na RTP1 ao espectáculo Vozes de Abril, essa homenagem que a A25A decidiu prestar (dia 4) a todos os que com a sua Arte e o seu Canto ajudaram a surgir e a consolidar Abril, percebeu que o mesmo evocava um outro espectáculo ocorrido na mesma sala (Coliseu dos Recreios), há 34 anos, pouco antes do dia "inicial inteiro e limpo" de onde "emergimos da noite e do silêncio" como escreveu Sofia.
Eu posso dizer que sou uma privilegiada porque participei nesses dois momentos histórico-culturais: 29 de Março de 1974 e 4 de Abril de 2008.
Jovem que era há 34 anos, aluguei com um grupo de amigos um camarote, do lado direito do palco, de onde assistimos a tudo que ocorreu naquela noite memorável e pudemos vaiar os pides quando um deles saltou para o palco (nem sei porquê) e gritar "tirem esse careca daí!"...
Pela primeira vez os artistas oposicionistas conseguiram reunir-se, o espectáculo até foi autorizado (organizado pela Casa da Imprensa) mas as cantigas foram censuradas de tal forma que os cantores só dispunham de algumas, inócuas para os censores do regime... mas estes também se enganavam (ou eram enganados) porque ao Zeca Afonso, a quem só deixaram cantar duas: Milho Verde e Grândola, repetiu esta tantas vezes, em coro com a assistência, que nasceu ali, tenho a certeza, naquele momento, a SENHA do 25 de Abril!
Lembro-me que o Tordo cantou a sua "Tourada" entrando e saindo pela porta dos fundos, como ele proprio recordou. Que a Maria do Amparo (agora a dar-nos um momento emocionante ao cantar com a filha Lucia Moniz) e o Carlos Alberto Moniz (agora como maestro) entoaram coisas do cancioneiro açoreano.
Lembro o Manuel Freite e o Zé Jorge Letria a virem ao microfone dizer que "tinham perdido as letras das canções" por isso não poderiam cantar o que a malta lhes pedia incessantemente .... e que, perante isto, a sala inteira pateou ensurdecedoramente e gritou "Fascistas! Fascistas!" durante minutos largos. E creio que foi aí que um pide, careca, saltou para o palco, motivando ainda mais a nossa indignação.
À saída foi um silêncio absoluto, pesado, impressionante, só se ouvindo os nossos passos na calçada, enquanto a Pide e a PSP nos observavam com as carrinhas a postos. Na sequência foram movidos autos e importunados artistas. Mas o dia da Liberdade estava muito perto, a menos de um mês.
Foi portanto com uma dupla emoção que pude assistir a este espectáculo no dia 4 de Abril, onde todos os intervenientes de há 34 anos estiveram presentes, agora sim, dando-nos o seu verdadeiro Canto Livre. Claro que faltaram alguns como o Adriano, o Ary ou o Zeca. Mas esses estarão sempre ao nosso lado.
Aquele, de 29 de Março, foi o espectáculo premonitório do radioso 25 de Abril ! Este, no dia 4, o da certeza de que os valores que Abril nos trouxe continuam vivos e de que a Memória não se apagará.

sexta-feira, abril 25, 2008

Não deixaremos morrer Abril

Pag. da revista Flama, Abril 1974

Confesso: há 34 anos ocorreu o dia mais feliz da minha vida. Embora a noção dessa felicidade me tenha sido revelada apenas no primeiro 1º de Maio quando percebi que, tal como no nosso país, também comigo passaria a existir um antes e um depois de 25 de Abril de 1974.
E tudo ganhou consistência e sentido no reaprender dos dias, das palavras, relações interpessoais, dos sentimentos, da vida. A coisa pública a irromper no nosso quotidiano. Conceitos novos, palavras novas, vivências novas.
O Sonho a comandar a vida, como nos ensinara o poeta. Todos os Ideais e Utopias a afigurarem-se-nos exequíveis. Peito aberto, generoso, como generosos foram os nossos "Militares de Abril".
Hoje, passados 34 anos, constatamos que muitos dos valores que aprendemos e vivemos nos foram subvertidos. E muitos dos direitos adquiridos, retirados.
Em nome da vida democrática foram-nos desvirtuando a Democracia.
Em troca, um conceito novo, a Precariedade, a invadir as nossas vidas.
Hoje tudo é precário e não só o trabalho e os contratos. Também a Liberdade e a Cidadania, a Família e os Afectos. Vivemos precariamente.
Bem nos avisara o Zeca de que "se alguém se engana (...) e lhes franqueia as portas à chegada, eles comem tudo e não deixam nada"
Mas sem hesitações, afirmo: valeu a pena o 25 de Abril, sim!
Apesar das desigualdades (nada precárias) que se têem acentuado, o 25 de Abril constituiu um virar de página e por muito que hoje nos queiram rasgar essa página, nós NÃO permitiremos.
O nosso cravo continua vivo. Muito obrigada, "Militares de Abril"!

terça-feira, abril 22, 2008

Faleceu o Chico Martins Rodrigues (1927-2008)


Sabiamo-lo mal. Mesmo assim a sua partida definitiva surpreendeu-nos. Foi esta madrugada, pelas 2 horas. O seu corpo será cremado amanhã, dia 23 de Abril, pelas 13,30 horas, no Alto de São João.
Dele guardo a lembrança de um homem solidário, sempre pronto a abraçar as causas em que acreditava. Morreu como viveu: lúcido e apenas com aqueles que ele próprio escolheu para o acompanharem. Foi um dos que mais sofreu às mãos da Pide. E não só sofreu como viu a sua família perseguida e destruida.
Há dois anos deu-me uma entrevista. Admirava-o como Resistente e homem de acção, mas cheguei a ele por caminhos ínvios. Ou seja, o Chico provinha de uma família numerosa e era irmão de dois artistas plásticos: o João Rodrigues e o José Leonel Martins Rodrigues.
O João Rodrigues, irmão mais novo, surrealista, matou-se em 1967 e dele ficaram desenhos dispersos que o amigo Mário Cesariny de Vasconcelos juntou num livro há muito esgotado.
A minha curiosidade ia para o José Leonel do qual ninguém mais ouvira falar, e alguns afiançavam ter falecido já. Mas não. O José Leonel ainda vive. Disse-me o Chico Martins Rodrigues, no decurso dessa tarde em que conversámos no seu velho escritório ali à Rua dos Açores, no Arco Cego.
Artista talentoso, José Leonel frequentou a António Arroio no inicio dos anos 40 (pertencia ao grupo do Café Herminius) e, quando se preparava para entrar na Escola de Belas Artes, foi apanhado pela Pide numa noite em Campo de Ourique onde, com outro, fazia pichagens nas paredes em vésperas do 1º de Maio de 1946.
O companheiro foi solto quase de imediato, ele ficou encarcerado. E porquê? Porque escrevera: "Morte a Salazar" e isso era um crime gravíssimo. Indiciava-o como muito capaz de matar o chefe do Estado ! A Pide tirou mesmo uma fotografia daqueles dizeres como prova do grave delito.
Foi muito maltratado pelos esbirros da Pide. De tal forma que endoideceu e recolheu ao Julio de Matos. Saíu mais tarde, mediante caução, mas nunca mais foi o mesmo. Nunca mais se dedicou à arte. Nunca mais conseguiu conviver com ninguém. Sempre assustado, sempre com medo, vendo polícias por todo o lado, desconfiando da propria sombra. Isolou-se e fechou-se num mutismo de que nunca mais se libertou.
Um dia desapareceu. Fugiu da própria família. Nunca ninguém o conseguiu encontrar. Já após a morte dos pais e de praticamente todos os irmãos, apareceu. Sem mais palavras. Creio que o irmão o foi buscar. E vivia com o Chico que tratou dele até ao fim.
Foi o António Domingues, que fora seu colega na Antonio Arroio, quem me alertou para o drama do José Leonel. Uma vítima da Pide de quem ninguém fala. Que ninguém conhece. De que não ficaram sequer registos gráficos. Apenas um eventual processo nos arquivos da Pide, como tantos outros.
Tal como existe um Monumento ao Soldado Desconhecido pela impossibilidade de se identificarem todos os que morreram nas frentes da guerra, dever-se-ia fazer um Memorial às Vitimas da Pide, tantas elas foram e, na sua maioria, desconhecidas.
Aqui fica a minha homenagem no dia em que partiu mais um guerreiro.

segunda-feira, abril 21, 2008

Jantar de Abril, a 18

jantar 18 Abril 2008 (minha mesa)

Tinha decidido afastar-me por uns tempos. Passaram meses, quase um ano, e senti que talvez estivesse na hora de reaparecer. Algumas pessoas se me dirigiram nesse sentido. Cá estou.
Na sexta feira, dia 18, chuva imensa (!) realizou-se a 5ª edição do jantar «Em Abril Esperanças Mil», desta vez na Fil - Expo. Confesso, o local não ajudou à festa. A chuva e o vento muito menos. Algumas pessoas menos jovens optaram por ficar em casa. Outras houve que não atinaram com a entrada. Mas, no cômputo geral, podemos dizer que foi uma grande jornada de confraternização.
Pessoalmente revi amigos mas o mais gratificante mesmo, aquilo que maior prazer me deu, foi ter conseguido juntar pessoas que nunca se tinham visto, todas «bonitas» e interessantes, e cujo único ponto de referência era eu, a conviverem e a sentirem prazer em se descobrirem. Como aconteceu na minha mesa, por exemplo.
O convivio e o calor humano valem sempre a pena.