terça-feira, junho 19, 2007

No dia dos teus anos ... a minha homenagem

Escultor Jose Dias Coelho 
(Pinhel, 19 Junho 1923 - Lisboa, 19 Dezembro 1961)


a Jose Dias Coelho


Seja minha a tua força, irmão
seja meu o teu braço, camarada
Sejam estes muros não um paredão
sejam uma ponte ou mesmo uma estrada.

Seja nela meu o teu anseio, irmão
seja minha a luta que na tua terra travas
seja ela o fruto das coisas que amavas.

Sejam essas coisas, as mesmas, irmão
sejam as que amo aqui nesta cela
seja para sempre a minha na tua mão
seja para todos uma vida bela
seja nela o trigo com a sua cor dourada
sejam as papoilas vermelhas de querer
seja sempre o dia que sucede à madrugada
seja outro o sentido da palavra morrer.

Sejam os mortos aqui ao nosso lado
sejam os seus também os nossos passos
seja em luta o ódio acumulado
sejam retesados nossos membros lassos.

Sejam as colinas de vontade erguidas
seja a sua força a que do amado vem
sejam nossas as tuas palavras queridas
seja minha a tua vontade também.

E não há muros, bombas ou insultos
que detenham as árvores ao nascer da terra
nem façam brotar flores de pensamentos estultos
nem parar o sol. E não será a guerra
com que os lobos sonham em noites de orgia
que impedirão que nasçam.

Das auroras por nascer
das estruturas por erguer
dos caminhos por andar
das flores por brotar
estendem-se as mãos do futuro
que envolvem teu corpo de bandeira.


Maria Alda Nogueira
Prisão de Caxias, 1963


Nota: poema inédito de Maria Alda Nogueira, que nos foi oferecido por Alexandre Castanheira.

segunda-feira, junho 18, 2007

As Incongruências do Vaticano

O Vaticano apelou aos católicos para que retirem o apoio financeiro à Amnistia Internacional (AI), devido a esta organização defender a despenalização do aborto.
"A Igreja Católica deixará de financiar a Amnistia Internacional devido à mudança de posição decidida", anunciou oficialmente o Cardeal Renato Marino, presidente do Conselho Pontifical Justiça e Paz.
"Jamais recebemos fundos do Vaticano, ou de entidades que dependem da Igreja Católica. Isso garante-nos a independência da organização como previsto nos nossos estatutos", desmentiu Riccardo Noury, porta-voz da secção italiana da AI.
Por sua vez, Kate Gilmore, subsecretária-geral da AI, afirmou em entrevista à Reuters: "Defendemos o direito da Igreja tratar de crenças morais. Mas um projecto de direitos humanos é para tratar do Estado, do estado de direito, e para criar um ambiente no qual as pessoas possam fazer escolhas morais como indivíduos".
O cardeal Renato Marino afirma em comunicado que "a suspensão de todos os financiamentos à Amnistia Internacional da parte, tanto das organizações como dos indivíduos católicos", é a "consequência inevitável", do "volte-face" da ONG quanto ao aborto.
"A Igreja Católica, por meio de um relato mal representado da nossa posição sobre aspectos selectivos do aborto, está a colocar em perigo o trabalho com os direitos humanos", respondeu Kate Gilmore. "Não se trata do aborto como um direito, trata-se do direito das mulheres a serem livres do medo, da ameaça e da coação ao gerirem as consequências do estupro e de violações aos direitos humanos", afirmou ainda.
"Se o cardeal fosse a Darfur e se colocasse entre [vítimas de estupro] e as pedras atiradas contra elas, aí ele poderia falar outra vez sobre se a Amnistia tem ou não integridade para se manter firme pelos direitos humanos", acrescentou Kate Gilmore que acusou o Vaticano de tentar injustamente "excomungar" a AI, sublinhando que a ONG vai "continuar a fazer campanha pela protecção da Igreja Católica" nas áreas onde houver discriminação religiosa.
Já em 1996, o Vaticano anunciou a suspensão da ajuda financeira à UNICEF, o fundo das Nações Unidas para a infância, que também acusou de promover o aborto.
A UNICEF difundia nos campos de refugiados de todo o mundo uma informação sobre um espermicida pós-coito destinado a jovens mulheres ou adolescentes vítimas de violação.
O financiamento do Vaticano à UNICEF elevava-se na altura a cerca de 2.000 dólares por ano.

sexta-feira, junho 08, 2007

Pessoas magras podem ser gordas por dentro

Fernando Botero, Pic-nic


Ser magro não significa que se esteja «imune à diabetes nem a outros factores de risco para doenças cardíacas», pois a «gordura interna pode ser tão perigosa quanto a externa», alertaram investigadores
E o inverso também será verdade? - perguntamos nós ....


Um grupo de investigadores alertou ontem que pessoas magras, com um peso dentro dos parâmetros normais, podem ser gordas por dentro devido à gordura que armazenam em redor dos órgãos vitais, como o coração, pâncreas ou fígado.

«Ser magro não significa automaticamente que não se é gordo», indicou Jimmy Bell, professor de imagiologia molecular no Imperial College em Londres que, desde 1994, e juntamente com a sua equipa examinou perto de 800 pessoas através de ressonâncias magnéticas de forma a descobrir onde armazenam a sua gordura.

Segundo os dados recolhidos, as pessoas que mantêm o seu peso através de dieta em vez de exercício parecem ter maiores depósitos de gordura interna, mesmo que outrora tenham sido magros.

Esta gordura interna que circunda os órgãos vitais, como o coração, fígado ou pêncreas, pode ser tão perigosa quanto a gordura externa que se aloja por baixo da pele, consideraram os investigadores.

Segundo a equipa de Bell, 45% das mulheres examinadas que tinham indicadores normais de massa corporal têm na realidade níveis excessivos de gordura interna.

Em relação aos homens, a percentagem de homens com excesso de gordura num corpo com indicadores normais ronda os 60%.


in Notícias da Manhã, 11 de Maio de 2007


sexta-feira, junho 01, 2007

No Aljube

Cadeia da Aljube de Lisboa




Num poço de treva te fecharam

mas as nascentes correm pelos teus cabelos



Tantas coisas no silêncio:

duas mãos que se apertam

com a noite em choro no asfalto

um cigarro que arde na penumbra

dum rosto um rolo preto

borrado de tinta preta

que rola torna a rolar.

- Terça-feira ninguém pega nos teares!



Nunca te sentiste tão perto dos homens

nem tanto amaste a vida sem temer a morte.



O respirar da cidade

faz vibrar as paredes do teu poço.

Mas em lugar de entranhas

não sentes amendoeiras floridas?

Tua mãe

leva-te de novo à escola pela mão...



A coragem-tesouro da Ilha Maravilhosa onde estava?



Foi a vida que o foi juntando

e o enterrou nas praias do Mar Mediterrâneo

que há dentro de cada um de nós.





António Borges Coelho, in Fortaleza, seara nova, 1974