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General Norton de Matos (1867-1955) |
José Mendes Ribeiro NORTON DE MATOS foi o homem que a oposição escolheu, em Julho de 1948, para protagonizar as primeiras supostas eleições livres para a Presidência da República, no ano seguinte, e que pela unidade e movimentações de massas que suscitou, fez tremer Salazar constituindo a primeira grande ameaça ao regime do Estado Novo.
Nascera Norton de Matos em Ponte de Lima, Viana do Castelo, a 27 de Março de 1867.
Velho republicano e maçon, ministro por duas vezes e Governador de Angola onde fundou a cidade de Nova Lisboa (actual Huambo), Norton de Matos fora um dos muitos professores destituídos pelo Governo de Salazar e impedido de continuar a dar aulas no Instituto Superior Técnico.
Como se sabe, após a vitória dos aliados, na Segunda Guerra Mundial, Salazar viu-se constrangido a ceder alguma abertura política para impressionar os países democráticos, convencido que estava da desagregação interna e convocou «eleições livres». Pelo contrário, esta abertura foi muito bem aproveitada pela oposição que sabiamente constituiu o MUD, Movimento de Unidade Democrática, nele agregando toda a família oposicionista. Norton de Matos junta-se a personalidades como Bento de Jesus Caraça, Mário de Azevedo Gomes, Manuel Mendes, Isabel Aboim Inglês, Mário Dionísio e muitos outros, tendo integrado a Junta Consultiva daquele movimento cívico.
O MUD teve o efeito de um autêntico vendaval no marasmo da vida social e política que se vivia no país desde a implantação do Estado Novo e manteve-se unida até se desagregar de novo após 49.
Em 1948 dá-se início ao processo de candidaturas para as eleições à presidência da república, que viriam a ocorrer em 1949, e o General Norton de Matos aceita ser o candidato da oposição.
No Manifesto que então dirigiu ao povo português, podia ler-se:
"Cansado de divergências internas, o povo português deseja que todos os habitantes de Portugal sejam acima de tudo portugueses; que a tolerância e o respeito pela pessoa humana os ligue a todos e permitam a cada um viver a sua vida sem o terror desmoralizante da incerteza."
Serão as primeiras "eleições" presidenciais "abertas" a outras candidaturas que não a do partido único instituído por Salazar, a União Nacional. Em confronto com Carmona, o candidato do regime que estava no lugar desde Novembro de 1926.
Estávamos em Janeiro de 1949, a campanha eleitoral iniciara-se no primeiro dia do ano. O povo tinha um candidato e em Coimbra, por exemplo, podia ler-se numa parede:
"Se votares por Carmona
Comes broa e azeitona.
Se votares por Matos
Comes sopa e dois pratos."
A campanha foi entusiástica e no dia 23 de Janeiro, perante uma multidão reunida no Porto, Norton de Matos caracterizava a Segunda República por que lutava:
"[...] não poderá existir nessa Segunda República nada de totalitário, de nazista e de fascista, de anti-democrático, de contrário aos direitos fundamentais do homem, da falta de respeito à pessoa humana, de exploração do homem pelo homem, de apagamento do indivíduo, quero dizer duma entidade real portadora de direitos e deveres, o cidadão, como unidade fundamental de todas as colectividades humanas e cujos atributos inamovíveis são, entre outros, os direitos à vida e à existência sã, à liberdade pessoal, ao trabalho (com o dever correlativo), à residência, à inviolabilidade do domínio, ao sigilo de correspondência, à propriedade pessoal, ao acesso a qualquer profissão, à instrução, à cultura, à personalidade, à assistência médica e à segurança social, à petição aos poderes públicos, à resistência perante a opressão e a tirania."
Mas Salazar recusava-se a abrir mão das "condições mínimas" exigidas para um acto eleitoral isento, em pé de igualdade para ambas as candidaturas. Norton de Matos acaba por desistir no dia 12 de Fevereiro, véspera das eleições, uma decisão saida do plenário das estruturas da candidatura de todo o país. Não sem alguma resistência do candidato que, apesar da idade e dos condicionalismos, ficara impressionado com o apoio popular, sobretudo no Porto, e considerava ter condições para ir às urnas.
Na verdade em Angola, onde a dificuldade das comunicações impediu que chegasse a notícia da sua desistência, votou-se. E Norton de Matos ganhou em Nova Lisboa.
Carmona manteve-se no poder até à morte em 18 Abril 1951, com 81 anos.
Norton de Matos faleceu a 2 de Janeiro de 1955. Tinha 87 anos.
Faz hoje precisamente 51 anos.
JC