sábado, junho 26, 2010

Hoje, homenagem pública a Carlos Pato


15H00 - Clube Vilafranquense - Vila Franca de Xira
16H00 - Romagem ao cemitério


Faz hoje 60 anos que morreste em Caxias torturado pela PIDE.

Foi com Homens como tu que se construíu o 25 de Abril.
Foi com Homens como tu que hoje temos Liberdade.

Obrigada, Carlos Pato!

Palavras de Alves Redol no 1º aniversário da tua morte:

«Quiseram os teus amigos mais íntimos que palavras minhas acompanhassem a publicação de alguns contos que escreveste. E nunca a nossa maravilhosa língua, a língua do povo que tanto amavas, e por quem deste tudo o que de mais precioso tinhas para legar, a mesma com que os teus filhos hão-de contar de ti aquilo que mereces, nunca a nossa maravilhosa língua se tornou tão incapaz para exprimir aquilo que era preciso dizer-se neste primeiro aniversário da tua morte.

Vejo-te ainda... Vejo-te sempre!

Compreensivo e digno, amoroso e forte, aberto às melhores promessas dos nossos dias, sensível à dor alheia, rebelde para as injustiças, e bom, sempre bom, com esse sorriso tão suave que era a imagem de ti próprio, que era o reflexo dum coração onde não cabia o ódio nem a cobardia...

Vieste com a mesma simplicidade dos camponeses que idolatravas, dos camponeses que eram carne da tua carne, e de quem herdaste essa calma interior, e essa espantosa força interior, que faz de cada um deles um herói sem nome – e que faz de todos eles a grande certeza, onde se alicerçou a independência nacional, e donde surgirá a pátria livre que ambicionavas para todos nós. Nem esse maravilhoso heroísmo te faltou – o dos sacrifícios anónimos e dos sonhos guardados mas nunca esquecidos, que tu, mais do que eles ainda, quiseste tornar vida.

Vejo-te ainda... E sempre!

Como um desses homens que traz o futuro no coração, e para quem o futuro não é essa coisa mesquinha do egoísmo individual – do meu ou mesmo do nosso – mas essa seara sublime de espigas sem dono que o mundo todo guardará para si...

Como um desses homens que não mede a vida da humanidade pela sua vida, e que se lhe exigem a sua, para que a outra seja mais digna de ser vivida, a oferece sem hesitações, alheio a recompensas...

Como um desses homens a quem o cientista deve o seu laboratório, o artista a sua obra, o escritor os seus livros, as mães o direito de criarem os filhos nos seus braços e de os entregarem, só depois, puros, belos e dinâmicos para as tarefas da paz...

Como um desses homens para quem os poetas escreveram os seus poemas...

Um José Gomes Ferreira:

Volta-te e olha para a terra
a carne da tua sombra
de flores acesa
Céu para quê?
O céu é para os que esperam
E tu morreste por uma certeza!

Ou um Carlos de Oliveira:

Mais vivo porque sofreste
A morte não veio, foi-se
A eternidade constrói-se
Na beleza com que viveste.


Ou ainda num epitáfio de Sidónio Muralha que mereces na tua campa:

Largos versos irrompem do teu silêncio de granito
E tu vives inteiro em cada grito
Tu que foste maior que todas as poesias.


Foi para homens como tu que estes versos se cantaram. Que o não duvide ninguém!...

Porque só quem viu uma população inteira a pedir, para si, o teu corpo, a caminhar, em silêncio, de braços agarrados numa muralha de dor, que também era esperança, entre lágrimas espontâneas, como se todos, até mesmo as crianças, fossem acompanhar um filho, poderá entender o que tu eras para todos nós...

Só quem viu mulheres e meninos do povo levarem-te raminhos de flores silvestres, numa homenagem que nunca conheci igual, e os teus amigos, e os teus companheiros de trabalho, e uma população inteira, todos sofrendo essa separação, numa angústia que estava mais no nosso sangue do que nos rostos torturados por esses golpe, é que saberá compreender e testemunhar que chorámos um Homem. Um Homem de que nos cumpre honrar o exemplo de dignidade e a lição de coerência.

Daí o sentir frustradas as palavras que te dedico, porque elas são incapazes de exprimir o que tu mereces e o que te devo...

- Devo-te muito do que há-de ser o futuro do meu filho; devemos-te todos, mesmo os que te quiseram mal, alguma coisa da felicidade que virá para os filhos de cada um... E por isso te chorámos, e por isso te lembraremos sempre, mais ainda nas horas de alegria do que nos momentos de amargura.»

Alves Redol

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